Mundo – Foram mais de sete horas de tensão. O grupo extremista islâmico Hamas chegou a suspender a entrega ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) de mais 13 reféns e acusou Israel de violar o acordo, por supostamente não respeitar o cessar-fogo e por dificultar a entrada de ajuda humanitária na Faixa de Gaza. O governo de Benjamin Netanyahu reagiu com a ameaça de retomar os bombardeios ao enclave palestino à 0h de hoje (19h de ontem, em Brasília), caso o segundo grupo de sequestrados não fosse solto. A libertação ocorreu cerca de uma hora antes do prazo final, depois de o Hamas anunciar que responderia positivamente às manobras dos mediadores Egito e Catar para a continuação da trégua.

Às 23h (hora local), a custódia de oito crianças e de cinco mulheres foi transferida à Cruz Vermelha pelos extremistas. Além dos 13 israelenses, quatro tailandeses também ganharam a liberdade, atendendo a um acordo em paralelo. Doze dos reféns soltos ontem foram sequestrados no kibbutrz de Be’eri. Pouco depois, Israel anunciou a soltura de 39 prisioneiros palestinos.

Capturada durante o ataque à festa rave no kibbutz de Reim (sul), Maya Regev, 21 anos, retornou a Israel sem o irmão Itay, 18, que segue na Faixa de Gaza. A jovem foi a única dos libertados que precisou ser transferida ao Hospital de Soroka, de ambulância, supostamente com uma lesão na perna. Ela estava consciente e não corria risco de morte. “Estou feliz que Maya esteja vindo em nosso encontro. Meu coração está dividido, porque meu filho, Itay, ainda está no cativeiro. Vou abraçar Maya tão forte. Não pararemos até que Itay e todos os reféns voltem para casa”, comentou a mãe, Mirit Regev, em comunicado à imprensa.

Hila Rotem, 12 anos, teve que deixar a mãe, Raya, em Gaza. A caçula da nova leva de libertados é Yael (Shoham), solta com a mãe, Adi, e a irmã Neve (8); o pai de Yael, Tal, está em poder do Hamas. Os irmãos Noam (16) e Alma (13), que tiveram o pai, Dror, assassinado, aguardarão pela libertação da mãe, Yonat.

A história de outra ex-refém, Emily Hand (9), emocionou o mundo. O pai da menina, o irlandês Thomas Hand, acreditou que a filha estivesse morta. “Não há palavras para descrever nossas emoções, depois de 50 dias difíceis e muito complicados. Estamos felizes, mas não nos esquecemos de Raya Rotem, que não veio para casa hoje, e de todos os reféns que estão lá”, afirmou a família de Emily, em nota.

Apreensão

No David Dear Sea Resort & Spa, às margens do Mar Morto, 150 moradores do kibbutz de Be’eri se reuniram diante de um telão para acompanhar, ao vivo, a libertação dos amigos. Outros 450 assistiram pela televisão, em seus respectivos quartos. Por volta das 17h15 (hora de Brasília), Amit Solvy, 70 anos, diretor do kibbutz, contou ao Correio que a atmosfera no hotel era de “alegria” e de expectativa pelo retorno das oito crianças e cinco mulheres a Be’eri.

“Houve um atraso. É difícil de compreender o que ocorreu”, afirmou Amit, por telefone. “O Hamas mudou o acordo. Um dos termos era de que eles não podiam separar integrantes de uma mesma família. Se havia uma mãe com duas crianças para serem libertadas, eles alteraram as regras para soltar apenas os menores.” Quarenta minutos depois, às 22h55 (hora local), o Hamas entregou o segundo grupo de sequestrados para a Cruz Vermelha.

Amit admitiu que o sábado foi cercado de muita tensão para os amigos e familiares dos reféns. “Nós apenas esperamos, e as horas estão passando”, desabafou, pouco antes de a troca de 13 israelenses sequestrados por 39 prisioneiros palestinos ser concretizada. Em Be’eri, onde viviam 1.200 pessoas antes de 7 de outubro, 28 moradores foram capturados pelos extremistas e levados para Gaza; 90 acabaram assassinados; e 110 casas foram incendiadas.

Desespero

Na sexta-feira, 12 dos 13 israelenses libertados pelo Hamas tinham sido levados do kibbutz de Nir Oz, onde viviam 420 pessoas antes do atentado — 40 foram mortas e 77 sequestradas. Por telefone, Irit Lahav, 57, porta-voz dos moradores da comunidade, disse que muitos deles também se juntaram para assistir à troca de reféns, em um hotel de Eilat, no sul de Israel. “O Hamas atrasou muito a entrega deles, ficamos muito desesperados. Quando nós os reconhecemos no telão, a sensação foi de felicidade. Vê-los caminhando, sozinhos, em direção à ambulância, nos trouxe muita alegria”, contou.

Irit conversou, ontem, com Keren Munder, 54, que foi solta com o filho Ohad, 9, e a mãe, Ruth, 78. “Ela está bem. Keren me disse que ficou com Ohad durante o tempo todo no cativeiro. Ambos estão com boa saúde. A voz de Keren transmite energia. Ela me contou que houve momentos bons e também muito ruins em Gaza.”

Na manhã de 7 de outubro, Irit e a filha, 22, dormiam, quando as sirenes tocaram em Nir Oz. “Tivemos 10 segundos para correr até o safe room (quarto seguro), com janelas de metal e paredes reforçadas. Minha filha falou: ‘Escuto tiros’. Eu respondi: ‘Imagina, não é nada’. Um minuto depois, a vizinha escreveu no WhatsApp que alguém tinha atirado dentro da casa dela. Nos minutos seguintes, vizinhos relataram o mesmo. Eu sabia que a porta não podia ser trancada por dentro. Começamos a escutar tiros com armas automáticas vindos de todo o kibbutz. Sabíamos que eles entrariam em nossa casa em minutos”, lembra. Por meio de um sistema de mensagens, os vizinhos relataram que os terroristas estavam incendiando imóveis e matando pessoas. Irit e a filha usaram um remo e um aspirador de pó para bloquear a porta. Conseguiram sobreviver.

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